terça-feira, 3 de abril de 2007

galina vishniévskaia em vídeo

Do Lauro: A versão é a pasteurizada, de 1962, reintitulada "Katerína Izmáilova". Mas o filme de Mikhaíl Shápiro, rodado em 1966, traz – tanto quanto eu sei – a única documentação em imagem de Galina Vishniévskaia em uma ópera completa (ela foi contratada para filmar um "Ievguiêni Oniéguin" regido por Borís Kháikin; mas a burocracia soviética era tão emperrada que, quando a produção ficou pronta, a sra Rostropóvitch estava no sétimo mês de gravidez, e teve de ser substituída por uma atriz, que dublou a sua voz). A partitura é censurada e a ópera, em sua segunda versão, foi impiedosamente cortada, para caber nas proporções de um filme padrão. Ainda assim, é única a possibilidade de ver a amiga pessoal de Shostakóvitch, a cantora para a qual ele escreveu peças fundamentais de seu catálogo, interpretando, de maneira eletrizante, a personagem de sua ópera. Em 1979, no Ocidente, Vishniévskaia e Rostropóvitch gravaram, para o selo EMI, a versão original, a "Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk", violentamente atacada pelo governo stalinista em 1936 (essa é a ópera que será apresentada no Brasil, pela primeira vez, durante o Festival do Teatro Amazonas, regida por Luiz Fernando Malheiro, e tendo Eliane Coelho no papel principal). Em 1979, infelizmente, não foi feito um vídeo com Galina. Ainda bem que, para vê-la e avaliar a qualidade de seu desempenho, existe esse filme. Vendo-a nesse papel em que, da entediada esposa de mercador, corroída por aquele “tédio russo” da província, de que fala Tchekhov, ela passa à mulher dominada pelo desejo e, depois à mulher torturada e prematuramente envelhecida, o paralelo que instintivamente me ocorre, pela intensidade das expressões fisionômicas, é Irene Papas, nas tragédias gregas filmadas por Kakoyánis. A técnica de superposições de imagem, sobretudo nas seqüências iniciais, é bastante datada; e a fotografia, em tons de sépia às vezes verde-azulado, típica do cinema soviético da década de 60, está envelhecida; mas Shápiro é dramaticamente eficiente em cenas como a da alucinação de Kátia, que imagina estar vendo o fantasma de seu sogro, Borís Izmáilov, que ela envenenou; ou a seqüência final, em que ela se atira no Volga, arrastando com ela Soniétka, a nova amante de Serguêi. Se compararmos este DVD à versão completa da "Lady Macbeth", filmada no Gran Liceu de Barcelona, com Nadine Secunde, não há como não concluir que esta Kátia Izmáilova – apesar de todas as desvantagens que apresenta – pertence a uma categoria superior de documentação da arte lírica no que ela tem de mais impressionante.

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